A tímida COP27: os protagonistas, os discursos e as conclusões
A COP 27 terminou morna e sem notícias estrondosas. A Peggada faz-te o resumo das principais conclusões. As alterações climáticas estiveram em cima da mesa
Em cima da mesa está a ativação do fundo para financiamento de ‘perdas e danos’ provocados pelas alterações climáticas, assim como um balanço desde a celebração do Acordo de Paris de 2015. O local escolhido para a cimeira do clima da ONU, o Dubai, tem gerado controvérsia, assim como o facto do presidente anfitrião estar ligado ao setor petrolífero.
Entre 30 de novembro e 12 de dezembro, representantes de praticamente todos países do mundo reúnem-se no Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, para a 28.ª Conferência das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas, mais conhecida como COP28.
Portugal é representado pelo primeiro-ministro, António Costa, durante os primeiros dois dias, sendo secundado pelo ministro do Ambiente e da Ação Climática e secretários de Estado de diferentes áreas.
Dois anos após a conferência organizada em Sharm El Sheikh, no Egito, um dos grandes destaques desta COP28 é o balanço inicial do que tem sido a ação climática a nível mundial desde a celebração do Acordo de Paris, em 2015, na COP21. Recorde-se que esse acordo previa como objetivos a redução das emissões e a limitação do aumento das temperaturas mundiais a, na pior das hipóteses, dois graus celsius acima dos valores que havia antes da era industrial.
À partida, os representantes deverão ter de reconhecer o fracasso dessa iniciativa, já que a emissão de gases com efeito de estufa (GEE) não só não abrandou, como acelerou. De resto, a 15 de novembro a Organização Meteorológica Mundial deixou um aviso que ensombra esta COP28: a concentração de GEE voltou a bater recordes em 2022 — foi a primeira vez que as concentrações de CO2 foram 50% maiores elevadas do que na época pré-industrial.
Se esta notícia de há duas semanas já era negativa, um novo comunicado feito na véspera da COP28 revelou algo ainda pior: prevê-se que 2023 seja o ano mais quente de sempre, com 1.4 graus acima dos valores pré-industriais. De acordo com a ONU, para que se conseguisse conter a subida do aumento de temperaturas, era necessária uma redução das emissões de GEE de 7,6% entre 2020 e 2030, o que parece cada vez mais improvável.
Um presidente comprometido
A coroar estes avisos alarmantes está a escolha do local para a COP28, que gerou desde logo controvérsia e ceticismo já que os Emirados Árabes Unidos são um dos principais produtores de petróleo do mundo. Mas o que fez mesmo correr tinta e esfriar as expectativas de que esta cimeira produza resultados eficazes foi a escolha do presidente indigitado para esta cimeira, Sultão Al Jaber.
Além de ser ministro da Indústria dos Emirados Árabes Unidos, Al Jaber é o presidente da Abu Dhabi National Oil Company (ADNOC) e tem sido responsável por expandir a carteiras de clientes da empresa que lidera e aumentar a produção de combustíveis fósseis.
Se esta situação não bastasse para revelar um conflito de interesses aparentemente insanável, a poucos dias do início da conferência foram revelados documentos que sugerem que Al Jaber tentou usar a sua posição na COP28 para reunir-se com representantes de governos estrangeiros e promover projetos da sua empresa.
Estas informações, vazadas por um whistleblower e divulgadas pelo Centre for Climate Reporting e pela BBC, mostram como Al Jaber tinha preparados temas de conversa para uma série de reuniões bilaterais que incluíam negociações de projetos petrolíferos e energéticos de empresas dos Emirados Árabes Unidos.
Nos documentos é possível ver, por exemplo, como estava previsto a ADNOC propôr à Alemanha a venda de gás natural liquefeito, assim como pretendia avaliar oportunidades de negócio em Moçambique, Canadá e Austrália, resume o Politico. Noutra instância, pretendia-se comunicar à Arábia Saudita e à Venezuela — dois dos maiores produtores de produtos petrolíferos do mundo — que “não há conflito entre a exploração sustentável dos recursos naturais de um país e o seu empenho perante as alterações climáticas”.
“Se estas alegações forem verdadeiras, isto é totalmente inaceitável e é um verdadeiro escândalo. O líder da cimeira climática deveria focar-se em avançar soluções climáticas de forma imparcial e não em marcar reuniões secretas que alimentem a crise. Este é exatamente o tipo de conflito de interesse que tememos quando o CEO de uma empresa petrolífera foi apontado para o cargo”, reagiu Kaisa Kosonen, coordernadora política da Greenpeace Internation.
A início, Al Jaber não contestou a autenticidade dos documentos, negando apenas que tenha tentado utilizar o cargo para promover projetos petrolíferos e energéticos dos Emirados Árabes Unidos. Mais tarde, um porta-voz da COP28 desacreditou oficialmente esta reportagem: “Os documentos referidos no artigo da BBC são incorretos e não foram usados pela COP28 em reuniões. É extremamente desapontante ver a BBC a usar documentos não verificados nas suas reportagens”.
Fundo “histórico” vai entrar em vigor — só não se sabe como
Apesar das polémicas e do pessimismo quanto ao que poderá sair desta COP28, o primeiro dia da cimeira foi marcado pela celebração de um acordo há muito discutido mas que tardava em sair do papel: o fundo criado para financiar “perdas e danos” provocados pelas alterações climáticas.
Este foi uma das magras conquistas da COP27 no Egito mas temia-se que não chegasse a ser colocada em prática. No entanto, foi esta sexta feira alcançado um acordo de princípio sobre o fundo, ainda que pouco se saiba como vai ser aplicado e em que moldes.
A ideia passa pelo financiamento de 100 mil milhões de dólares por ano para auxiliar o combate às alterações climáticas e aos seus efeitos nefastos. Estes montantes serão destinados sobretudo aos países mais económica e ambientalmente vulneráveis.
Apesar do acordo só vir a tornar-se efetivo com uma assinatura formal de todos os países participantes, que acontecerá no final da COP28, este já está a ser encarado por Al Jaber como uma “decisão histórica” que é “um sinal positivo para o mundo e para o nosso trabalho”. Já Madeleine Diouf Sarr, presidente do grupo dos 46 países menos desenvolvidos a participar na cimeira, disse que a decisão tem um “significado enorme para a justiça climática”.
O fundo será gerido pelo Banco Mundial durante os primeiros quatro anos a partir do seu início efetivo, previsto para 2024, o que também gerou oposição por parte dos países em desenvolvimento. Em causa está o facto de considerarem esta uma instituição controlada pelos países ocidentais.
Vários países avançaram desde já com contribuições neste primeiro dia da COP28: a União Europeia anunciou o alocamento de 245 milhões de dólares, 100 milhões dos quais provenientes da Alemanha — a maior contribuição individual por um país, a par de um montante idêntico anunciado pelos Emirados Árabes Unidos. O Reino Unido adiantou 75 milhões de dólares, ao passo que os EUA ficaram-se pelos 24,5 milhões e o Japão 10 milhões.
Todos estes valores perfazem um total de 429 milhões de dólares, algo muito distante dos 100 mil milhões previstos. A incógnita quanto à exequibilidade de chegar a este valor aumenta com o facto do acordo prever que as contribuições sejam apenas voluntárias e não obrigatórias, moldes que foram celebrados por pressão dos países desenvolvidos.
A própria cifra dos 100 mil milhões de dólares para auxílio é de eficácia dúbia, porque, como recorda o The Guardian, os relatórios mais recentes apontam que os danos causados pelas alterações climáticas nos países em desenvolvimento já ultrapassam os 400 mil milhões de dólares por ano. Por essa razão, Al Jaber também já frisou que será necessário duplicar o financiamento da adaptação até 2025.
Até dia 12 de dezembro, seguem-se mais de 300 iniciativas e eventos paralelos que envolvem temas como saúde, descarbonização, energia, urbanização, transportes, oceanos e agricultura. Já no que toca a questões mais urgentes, prevê-se a discussão sobre o estabelecimento de regras para regular o mercado de carbono e — tendo em conta o previsível reconhecimento do falhanço das metas do Acordo de Paris — novas medidas para cortar emissões de GEE e tentar limitar a produção de combustíveis fósseis.
A COP 27 terminou morna e sem notícias estrondosas. A Peggada faz-te o resumo das principais conclusões. As alterações climáticas estiveram em cima da mesa
Sentar centenas de nacionalidades e grupos de interesse à volta de uma mesa não é simples. Chegar a um consenso ainda menos. Mas o que
COP, IPCC, UNEP, WMO. A ação climática tem muitas siglas e hoje vamos falar-te mais dobre aquela que não é mais do que a reunião
Este artigo aborda uma ação que promove a adoção de medidas urgentes para combater as alterações climáticas e os seus impactos. O ODS 13 também pretende melhorar a educação sobre mitigação das mudanças climáticas e redução de impacto.
Esta publicação também está disponível em: English (Inglês)
Para estar a par de tudo o que acontece na área da sustentabilidade, consumo responsável e impacto social.