A poucos dias das eleições legislativas, olhamos os programas eleitorais dos partidos com assento parlamentar em matéria de sustentabilidade e ambiente. O que defende cada partido? Quais as metas e as promessas? Sabe tudo neste artigo.
Educação, saúde, cultura, transportes, segurança social, desemprego. Estes são temas que nunca ficam de fora das campanhas eleitorais. Mas está mais do que claro que há um novo assunto em cima da mesa e que não pode ser ignorado por qualquer um dos partidos a votos: a sustentabilidade. Fomos escrutinar os programas eleitorais dos partidos com assento parlamentar e perceber o que cada um prevê fazer pelo país — e pelo planeta — caso seja eleito.
Emergência climática e neutralidade carbónica
Em Portugal, de um modo geral, os partidos com representação parlamentar reconhecem esta crise e estão atentos à necessidade de atuar de forma urgente.
O PS propõe aumentar para 80% o peso das energias renováveis na produção de eletricidade até 2026 e o PSD estabelece 2045 como o novo horizonte para a neutralidade carbónica, antecipando ainda uma revisão constitucional verde, que incorporaria as questões do ambiente e sustentabilidade no texto fundamental.
À esquerda, BE avança a industrialização nacional na área solar e o reforço da produção eólica, enquanto a CDU pretende adotar um Plano Energético Nacional que tenha como objetivos a utilização racional da energia, a eficiência energética e o aproveitamento de recursos endógenos.
De uma forma mais premente, o Livre pretende declarar emergência climática nacional e acelerar os esforços climáticos, com uma redução de 65% das emissões nacionais de gases com efeito de estufa até 2030, e o PAN defende a instituição do crime de ecocídio no regime legal enquanto crime contra a humanidade.
Há, porém, posições que, embora não negando a gravidade da situação climática, são mais tímidas na concretização dos planos e metas ambientais. O CDS não antecipa metas, mas garante que cumprirá o que for estipulado pela UE, a Iniciativa Liberal aposta na dedução, em sede de IMI, dos custos associados à implementação de medidas de eficiência energética nos edifícios, e o Chega estabelece o objetivo da autossuficiência energética com base em energia sustentável, eficiente e limpa.
Economia circular e gestão dos resíduos
A forma como gerimos os nossos recursos e resíduos é fundamental para que não exploremos mais do que aquilo que a Terra consegue repor. Os princípios da sustentabilidade, da economia circular e da gestão de resíduos são tratados pela maioria dos partidos (excetuando-se o Chega).
Os socialistas querem potenciar a formação de hubs de economia circular nacionais e desenvolver uma economia azul circular, promovendo modelos de negócio baseados na recolha de lixo marinho e na sua valorização industrial-comercial. Os sociais-democratas sugerem uma abordagem consistente das questões ambientais da agricultura e da pecuária.
O BE foca-se nos plásticos, defendendo a redução de embalagens de bebidas, a abolição do plástico de uso único, a proibição da dupla embalagem e a proibição dos microplásticos (banindo, em 2022, cosméticos e produtos de higiene que os contenham). Além disso, o Bloco sugere ainda um sistema efetivo de recolha de óleo alimentar usado nos espaços urbanos e incentivos à venda a granel em supermercados e mercearias. De forma mais contida, a CDU prevê apenas a adoção de um plano de combate à obsolescência programada, que preveja medidas que garantam o prolongamento da durabilidade dos equipamentos. O CDS refere apenas a aplicação do IVA à taxa reduzida para todos os produtos que valorizem resíduos.
Os programas do Livre e do PAN vão mais além. Para o Livre, é importante acabar com a obsolescência programada e instigar produtos de longa duração, advogar o direito à fabricação e reparação, diminuir o impacto da indústria da roupa e moda e assegurar a meta de 80% na taxa de reciclagem final em 2030. Já para o PAN, é necessário impulsionar o investimento na inovação e apoios económicos que permitam alavancar produtos e serviços de cariz circular, apostando em modelos de negócio que promovam a extensão de ciclo de vida dos produtos e criando estímulos que beneficiem práticas de valorização de matérias secundárias.
Por fim, a Iniciativa Liberal defende que a gestão dos resíduos e a economia circular deve ser uma responsabilidade partilhada entre poder público e privados. Por isso, a IL avança apenas um plano de ação nacional para corrigir e otimizar o fluxo de Recolha de Resíduos Elétricos e Eletrónicos. Este fluxo é, de modo transversal, mencionado também nos programas de PS, PSD, BE, Livre e, com particular incidência, no programa do PAN, que sugere ainda aumentar o âmbito da responsabilidade alargada do produtor a fluxos de resíduos que neste momento não estão abrangidos para que os produtores assumam os custos inerentes à gestão dos produtos que colocam no mercado.
Proteção da biodiversidade
Para estas eleições, há ainda vários programas com medidas concretas para a salvaguarda da biodiversidade em território nacional. De um modo transversal, PS, PSD, BE, CDU, PAN e Livre mencionam a necessidade de preservar e aumentar a biodiversidade em território nacional. O CDS, apesar de não referir a proteção da biodiversidade, prevê agravar o quadro penal para os condenados pelo crime de fogo posto florestal.
Dentro deste tema, é possível encontrar outros pontos de convergência. BE, PS e PAN apelam à criação de uma rede de áreas marinhas protegidas que garantam a preservação da biodiversidade em pelo menos 30% do mar nacional. Livre e PAN defendem alterações na prática da caça. Enquanto o Livre defende a abolição do uso de munições com chumbo e a suspensão da caça a espécies em declínio populacional, o PAN manifesta a intenção de abolir, por completo, a caça.
Existem, no entanto, outros pontos singulares que vale a pena referir. O Bloco pretende valorizar a plantação de espécies autóctones, reduzindo a área de eucalipto, e proibir a nova mineração em áreas protegidas. O Livre destaca a urgência de rever o Livro Vermelho dos Vertebrados em Portugal e de criar um Programa Nacional de monitorização e avaliação contínua do estado das espécies selvagens, habitats, ecossistemas e geossítios. O PS aposta na reflorestação marinha e na criação de maternidades e recifes artificiais em articulação com as áreas marinhas protegidas.
O PAN é o partido com o programa mais ambicioso nesta temática. O partido liderado por Inês de Sousa Real pretende criar santuários marinhos, assegurar a colocação de ecoilhas em todos os portos marítimos (com vista à adequada separação,
Além dos tópicos já abordados, destacamos outras medidas de cada partido político em matéria de sustentabilidade e ambiente
Bloco de Esquerda
1. Antecipar a proibição da incorporação de biocombustíveis produzidos a partir de óleo de palma para 1 de janeiro de 2022.
2. Um programa com vista à massificação da eficiência e conforto térmico no parque habitacional no valor de 150M€/ ano.
3. Reconversão da indústria cimenteira com integração de produtos mais ecológicos e sustentáveis, nomeadamente através da incorporação de resíduos de construção e demolição, reduzindo as emissões e a necessidade extrativa.
CDS
1. Sistemas logísticos integrados de recolha de biomassa que, devidamente armazenada, possa ser utilizada na produção de energia e viabilizar economicamente a limpeza permanente das zonas agro-florestais.
CDU
1. Promoção do acesso, utilização e salvaguarda dos recursos hídricos, com garantia da sua gestão e propriedade públicas, no âmbito de uma Estratégia Nacional de Garantia da Segurança Hídrica do País.
2. Adoção de um plano nacional de incentivo à produção e consumo locais, no quadro de um estímulo mais geral à produção nacional, pautado por critérios de sustentabilidade agroalimentar.
3. Assegurar a reversão da segmentação e entrega a grupos estrangeiros de importantes ativos nacionais, com a recuperação do seu controlo público (EDP, REN, GALP).
Chega
1. Políticas que assegurem que os projetos de energias alternativas – solares, hidráulicos ou eólicos – garantam rendimentos aos particulares residentes nas zonas rurais.
Livre
1. Assumir uma redução do consumo energético verdadeiramente eficaz, indo para além dos 35% atualmente assumidos para 2030 e promovendo uma estratégia global de redução do consumo.
2. Criar uma taxa universal sobre o carbono.
3. Seguir atentamente o desenvolvimento de novas tecnologias de produção de energia nuclear (como os small modular reactors, ou a fusão nuclear).
Iniciativa Liberal
1. Alteração progressiva da base dominantemente regulamentar para uma base dominantemente contratual, nas políticas ambientais.
2. Introduzir incentivos para a renovação das redes de distribuição, bem como de penalizações para os Municípios /Entidades Gestoras com elevado nível de perdas de água na distribuição em baixa.
3. Introdução de uma fiscalidade “verde” para equipamentos que promovam a redução do consumo doméstico ou maior reutilização da água doméstica.
PAN
1. Instituir o Ministério do Ambiente, Biodiversidade e Proteção Animal.
2. Garantir a atribuição de competências à Forças Armadas para a fiscalização de atividades ilegais, em particular a captura ilegal de espécies protegidas, reconhecendo a importância dos oceanos e da biodiversidade marinha;
3. Garantir a renaturalização de minas abandonadas, bem como o seu tamponamento adequado;
PS
1. Reduzir até 2030 55% das emissões de GEE e 40% emissões no setor dos transportes.
2. Adotar uma fiscalidade verde em linha com o objetivo de transição justa com uma transferência progressiva da carga fiscal sobre o trabalho para a poluição e o uso intensivo de recursos.
3. Implementar a Estratégia de Longo Prazo para a Renovação dos Edifícios, aprovada em 2021, que inclui um roteiro com medidas e objetivos indicativos para 2030, 2040 e 2050 e a Estratégia Nacional de Longo Prazo para o Combate à Pobreza Energética 2021-2050.
PSD
1. Criar planos municipais de descarbonização e premiar os concelhos que mais contribuírem.
2. Implementação de um programa que permita ao sector agroalimentar produzir energia renovável.
3. Retomar a reforma da fiscalidade verde, aprofundando-a como catalisadora das boas práticas ambientais e assegurando a neutralidade fiscal deste instrumento com a consequente redução da carga fiscal sobre os rendimentos.