É nutricionista, é vegetariana e acaba de lançar um livro que nos ensina a comer bem, aproveitando o que é da época e sem desperdiçar o importante. Vê aqui a nossa conversa com a Ana Isabel Monteiro, mais conhecida como Laranja Lima.
É daquelas nutricionistas que não come só alfaces nem nos prega moralismos em forma de Bolacha Maria. A Ana Isabel Monteiro, que todos conhecemos como Laranja Lima é adepta do prato bem composto, colorido, nutritivo e cheio de sabor.
Além de todas as dicas que partilha na sua página de Instagram, lançou agora um livro, o “Vegetariano nas quatro estações”, que nos ensina a cozinhar com o que natureza nos dá.
Numa conversa com a Peggada falamos de comida, claro, de desperdício, de bebés e de que forma podemos sempre fazer mais por nós, pela nossa saúde e pelo planeta.
Qual foi a tua motivação para te tornares vegetariana?
Essencialmente, os animais. Já lá vão quase 4 anos. Tínhamos adotado a Lima (a minha cadela) e fez-me alguma confusão amar tanto aquele ser pequenino e estar a comer outros, de outras espécies. Então decidi deixar de comer “filhotes” e foi uma questão de dias até deixar mesmo a carne e peixe.
Desde que tornaste vegetariana estás também mais atenta às questões ambientais, ou foi essa preocupação que te levou a adotar novos hábitos alimentares?
Na altura não pesou na minha decisão, mas estou muito mais atenta a isso, sim. Acho que todos devíamos estar, na verdade. Vegetarianos ou não!
De que forma a cozinha vegetariana pode ser mais amiga do ambiente?
As leguminosas são as estrelas da cozinha vegetariana, sendo riquíssimas em hidratos de carbono, fibra, proteína, ferro, zinco, entre outros. Ora, para produzir 1kg de feijão usamos 1/4 de água em relação ao que é preciso para produzir 1kg de bife de vaca. Só aí já estamos em vantagem. Depois há outros fatores que não são apenas típicos do vegetarianismo, mas que também ajudam: aproveitar os alimentos da raiz até à rama, preferir hortofrutícolas da época, os próprios métodos de confecção, como os estufados… tudo coisas que poupam o ambiente.
Que métodos anti-desperdício usas na forma como cozinhas e te alimentas?
Tento usar sempre a totalidade dos hortofrutícolas. Abóbora na sopa, por exemplo, vai com casca. O mesmo em relação à cenoura, batata, curgete… também aproveito tudo dos brócolos e da couve-flor, incluindo o talo mais grosso e as folhas. Gosto de congelar também cascas de cebola e depois fazer um caldo, por exemplo. E na fruta só não como o que não posso, mas nalgumas receitas uso a casca de banana e de laranja também.
No teu livro falas bastante do planear refeições. É uma forma de comer melhor e, ao mesmo tempo, evitar o desperdício?
Sem dúvida! Porque compras apenas o necessário e cozinhas as quantidades certas também.
Conta-nos mais sobre o teu livro. Como foi o processo de organização da informação e escolha das receitas?
A primeira parte teórica começa por abordar ó vegetarianismo no mundo, depois em Portugal e depois vamos mais a fundo. A informação está quase em funil a nível de pormenor. Já as receitas estão organizadas por estação do ano, porque é assim que me faz sentido a alimentação: seguir o ritmo da natureza. Dentro de cada estação encontramos 5 receitas de pequeno-almoço e snacks, 10 de pratos principais e 5 de sobremesas. Nem todas são o que se esperaria de uma nutricionista talvez, porque há algumas mais gulosas. Mas isso para mim é que é uma alimentação saudável, este espaço para o equilíbrio.
Porque decidiste dividir as receitas por estações do ano?
Porque acredito que a natureza nos dá o que precisamos, quando precisamos. Se formos a pensar nas frutas de verão, por exemplo: temos morangos, melão, melancia… todos eles com um grande teor de água, que vão ajudar na hidratação nos dias mais quentes. Pelo contrário no inverno temos frutas ricas em vitamina C, como o quivi e a laranja, que vão prevenir gripes e constipações. Além disso, uma alimentação sazonal é mais económica, mais nutritiva e mais amiga do ambiente.
Tens uma receita preferida?
Tenho muito orgulho em todas elas, mas adoro as panquecas de banana e morangos, o bolo de banana e chocolate sem açúcar, os gnocchis com molho de tomate e coco com casca de batata, o chili de feijão e batata-doce e também o empadão de feijão azuki.
Tens receitas em que usas o alimento por inteiro, como a banana ou a laranja. É a prova de que descartamos mais do que é preciso?
Sim, embora esses casos específicos sejam mais difíceis de replicar no dia a dia. Mas tenho o caldo de legumes que depois é usado no risotto de cogumelos. E cascas de batata crocantes. Acho esses exemplos mais replicáveis no dia-a-dia.
Nessa transição para o vegetarianismo, há também quem opte por consumir produtos mais processados ou use o tofu/seitan como base de substituição da carne/peixe. Que conselhos darias a essas pessoas?
Quanto ao tofu e seitan eu não vejo problema, porque são alimentos minimamente processados. Até nós conseguimos fazer em casa. Quanto àqueles produtos alimentares que tentam imitar a carne e o peixe é que acho que devemos ter alguma atenção e usar apenas esporadicamente. Não só pela parte da saúde, mas da carteira.
Desde que te tornaste vegetariana, passaste a ser procurada mais por pessoas que seguem este tipo de alimentação?
Sem dúvida. Diria que 90% dos meus pacientes são vegetarianos, vegans, ou pessoas que querem reduzir o consumo de produtos animais.
Achas que os profissionais de saúde, no geral, não estão preparados para seguir vegetarianos da mesma forma que o fazem com quem tem uma alimentação mais tradicional?
Quero acreditar que os profissionais de saúde se vão atualizando a este nível, até porque sabemos que o número de vegetarianos em Portugal está a crescer.
Passaste uma pré-concepção, gravidez e pós-parto como vegetariana. Tiveste que ouvir muitos comentários de quem duvida ser possível ou o facto de seres nutricionista serve de escudo?
Felizmente não ouvi comentários a esse nível, também porque me rodeei de profissionais que compreendessem. A minha obstetra era vegetariana, por exemplo. Mas mesmo no centro de saúde fui respeitada. Quero acreditar que não só por ser nutricionista.
Que peggada queres deixar este planeta?
Quero deixar um mundo onde o meu filho possa crescer de forma livre e saudável. Dificilmente vai ser um mundo melhor do que o temos agora, mas ainda vamos a tempo de não fazer mais estragos .
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