Não comprou berço, nem banheira, nem chupetas, nem brinquedos. Da lista de maternidade de Inês Pais fazia apenas parte o essencial: uma gravidez bem acompanhada e muito amor para a Alma.
Vegan e defensora de uma alimentação feita com ingredientes naturais, Inês enche-nos o Instagram de receitas sem produtos de origem animal, mas cheios de sabor. É um prazer para quem a segue ver a sua filha de um ano comer brócolos como gente grande ou a mexer nos legumes que chegam em cabazes todos os meses lá a casa.
Defensora do brincar livre, do co-sleeping, das fraldas reutilizáveis e da livre demanda na amamentação, Inês simplifica a maternidade e mostra que não é preciso muito para criar uma criança com tudo o que ela precisa para ser feliz.
À Peggada fala sobre maternidade, claro, mas também sobre alimentação, até mesmo aquela feita à base de bolos e chocolates, como a que tinha em adolescente.
Quem te segue há algum tempo, sabe que há uma Inês antes e depois do nascimento da Alma. Consegues distingui-las?
Sim. Essa transformação foi começando na gravidez mas intensificou-se com um bebé cá fora, quando tudo se tornou mais real. Apaixonei-me pelo mundo da gravidez, parto e parentalidade.
Essa mudança deu-se no teu Instagram como reflexo do que aconteceu na tua vida?
Sim, sempre tentei que o meu instagram mostrasse quem eu sou e por isso, à medida que eu cresço ou que os meus interesses se alteram, isso é espelhado na minha página.
Da partilha de receitas, passaste a partilhar mais sobre a tua forma de educar a Alma. Porquê essa mudança?
Porque senti que podia deixar um contributo, seja a partilhar informação atualizada, seja a mostrar como podemos simplificar a forma como se aborda a chegada de um bebé.
Estás até a estudar para ser doula. Porquê esta mudança de vida?
Já há alguns anos que percebi que o que me motiva todos os dias é tentar tornar o mundo num lugar melhor do que está, mesmo que numa micro escala. E, até há uns meses, isso passava por deixar um impacto positivo dentro dos temas da sustentabilidade e da alimentação. Mas senti que podia ir mais longe e ao ter passado pela gravidez e parto — e agora pela maternidade — acredito mesmo que a forma como nascemos e crescemos também muda o mundo. Eu tive um apoio excelente no caminho para o parto, que culminou num parto humanizado e, nos cuidados ao bebé, também me senti muito bem acompanhada, mas sei que, infelizmente, essa não é a realidade da maioria das pessoas. Portanto, a formação de doula surge como forma de fazer a diferença neste mundo que carece tanto de apoio, seja emocional, seja em termos de informação atualizada e humanização.
Até ao nascimento da Alma, vias-te a trabalhar sempre na área da alimentação saudável?
Não. Sabia que queria continuar dentro dessa área, mas não de forma exclusiva. Via-me a expandir a minha área de atuação, mas não sabia ao certo para onde.
Tens uma alimentação de base vegetal. Como aconteceu essa mudança na tua vida?
Tudo começou quando, um dia, decidi ver o documentário Cowspiracy. Deparei-me com realidades das quais não tinha noção e a partir daí comecei numa busca incessante por mais informação. E fui deixando os produtos de origem animal. Primeiro a carne e os lacticínios — e achava que ia ficar por aí — e, depois, quando fui estudar culinária para Londres, deixei o peixe e os ovos, muito pela influência que aquela cidade tão “vegan-friendly” teve em mim.
Antes dessa mudança sempre te preocupaste em comer bem? Como era a tua alimentação?
Em miúda, na verdade, comia muito mal, não gostava de quase nada. Mas bolos, bolachas e chocolates eram sempre bem vindos. Depois, mais na adolescência, comecei a gostar das refeições vegetarianas (e mais saudáveis) que a minha mãe preparava e quando fui viver sozinha, aos 21 anos, fui beber muito dessas memórias das comidas que a minha mãe fazia para me inspirar a cozinhar. A partir daí, essa preocupação em comer bem foi crescendo.
A consciência ecológica veio com a preocupação com a alimentação ou houve outro gatilho?
Vieram em conjunto, sim.
Quais foram as primeiras mudanças que fizeste no teu dia a dia para diminuires a tua pegada ecológica?
A primeira foi a alimentação vegetal e depois comecei a olhar para tudo o que consumia de descartáveis para perceber que alternativas tinha e conseguia implementar. Seguiu-se a fast fashion que, de um dia para o outro, deixei de consumir e comecei a optar por comprar roupa em segunda mão. Depois foram os produtos de higiene e a adoção do minimalismo cosmético. Comecei também a comprar produtos secos a granel, sempre que possível. Depois vendi o meu carro e, juntamente com o meu marido, decidimos ficar com um carro para os dois. Mais tarde comecei também a ganhar o hábito de, sempre que preciso de comprar algo novo (ex. uma mobília, um livro, algo tecnológico), procurar primeiro se existe em segunda mão.
E com o nascimento da Alma? Conseguiste continuar essa jornada sustentável?
Sim, o que também ajuda a simplificar imenso a maternidade.
Nesse sentido, como te preparaste para o nascimento da Alma?
Primeiro fui tentando perceber o que realmente é necessário para um bebé. Comprámos talvez 1/10 do que as típicas listas de enxoval referem e optámos por usar fraldas reutilizáveis. E muito do que comprámos foi em segunda mão, especialmente as roupas.
Sentes que ainda és caso raro em termos de maternidade minimalista?
Do que vejo sim, sinto, mas também acredito que cada vez vá sendo menos raro.
Quais os artigos mais habituais (e ditos como essenciais) é que descartaste à partida?
O berço, a banheira de bebé, o termómetro para a água, o parque ou ginásio de atividades, a chucha, a escova de cabelo para bebé, todos os produtos de higiene para bebé, a toalha de banho do bebé, a almofada de amamentação, peluches…
E que planos tens para continuares nesse caminho à medida que a Alma cresce?
A alimentação, em casa e enquanto depender de nós, vai manter-se igual à nossa, 100% vegetal. Os brinquedos vamos vendo o que faz sentido. Tencionamos apostar mais em materiais abertos para explorar e não tanto em brinquedos fechados. Quanto à escola, gostávamos que andasse numa escola de ensino alternativo, e que, à partida, também estará mais alinhada com as nossas escolhas mais ecológicas. Tudo o resto, vamos passando o nosso exemplo, e esse é o maior impacto que podemos ter nela.
Que pegada esperas deixar neste planeta?
Adorava deixar uma pegada por um planeta onde as pessoas vivem de forma mais consciente e mais conectada com os outros, com a natureza, com as suas emoções. Um planeta onde todos co-existimos com mais amor e sem negligência ao próximo.